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7 de novembro de 2009

Poema # 006



( Do livro, não publicado,  

  "TONS & SONS" )





DIAS DE CINZA


Falo a sós comigo

       há tanto que me sinto o meu melhor amigo

A sala está no coração do nevoeiro

       e toda a claridade se ocultou de corpo inteiro 


Numa mão

       a evidência de um cigarro apagado

Noutra mão

       uma carta suspensa

Suspensa do tecto

       uma luz moribunda

No espelho

       três décadas de um rosto marcado

Vazado na mesa

       o resto do álcool bebido de um trago 

 

Falo a sós comigo

       há tanto tempo que me sinto o meu melhor amigo 

A sala

       está no coração do nevoeiro

Só há claridade

       no interior de cada dia seguinte 

 

Trago neste silêncio felino

       todo o futuro que posso carregar num pulso

       todo o futuro ainda não reinventado

       adormecido como um recém-nascido

 E também todo o passado

       erguido no outro pulso 

Atravessado a nado para o outro lado que conheço

       apenas como se conhece qualquer desconhecido

 

Trago neste silêncio felino

       um orgasmo de presente escondido 

Que vou desenvolvendo pouco a pouco

       até dar corpo 

       a um corpo novo de menino

                                     

Porto   1985 - Junho 



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